Antonio Carlos Nóbrega é um artista e músico brasileiro.
Filho de médico, estudou no Colégio Marista do Recife. Aos 12 anos ingressou na Escola de Belas Artes do Recife. Foi aluno do violinista catalão Luís Soler e estudou canto lírico com Arlinda Rocha.
Com sua formação clássica, começou sua carreira na Orquestra de Câmara da Paraíba em João Pessoa, onde atuou até o final dos anos 60. Na mesma época participava da Orquestra Sinfônica do Recife, onde fazia também apresentações como solista.
Como contraponto à sua formação erudita, Antonio Nóbrega participava de um conjunto de música popular com suas irmãs. "Só que a música popular que eu compunha e tocava era a das rádios e da televisão: Beatles, Jovem Guarda, a nascente MPB, Caetano Veloso, Edu Lobo".
Em 1971 Ariano Suassuna procurava um violinista para formar o Quinteto Armorial e, após ver Antônio Nóbrega tocando um concerto de Bach, lhe fez o convite que mudaria completamente sua carreira musical.
Antônio Nóbrega, que até essa ocasião tinha pouco conhecimento da cultura popular, passou a manter contato intenso com todas suas expressões como os brincantes de caboclinho, de cavalo-marinho e tantos outros, que passou a conhecer e pesquisar.
Nóbrega revelou-se um fenômeno, ao conseguir unir a arte popular com a sofisticação. É, literalmente, um homem dos sete instrumentos, capaz de cantar, dançar, tocar bateria, rabeca, violão etc. Realizou espetáculos memoráveis em teatros do Rio de Janeiro e de São Paulo, com destaques para Figural (1990) e Brincante (1992). Figural é um espetáculo em que Nóbrega, sozinho no palco, muda de roupa e de máscaras para fazer uma das mais ricas demonstrações da cultura popular brasileira e mundial.
Terminou em 12 de novembro de 2006 a temporada paulistana do espetáculo 9 de Frevereiro, e, em seguida, iniciou a temporada carioca. Este espetáculo, cujo nome é uma alusão ao carnaval pernambucano e um trocadilho com frevo, explora várias formas de se tocar frevo: com uma orquestra de sopro, com um regional, com violino e percussão etc. Também há várias das formas de se dançar frevo: com apenas um dançarino (Nóbrega) em passos estilizados de dança moderna, com vários dançarinos em passos de frevo, com e sem sombrinha e até o público todo, em ciranda de frevo. Como não poderia faltar em um espetáculo enciclopédico sobre o frevo, há pelo menos dois momentos didáticos: em um a orquestra explica várias modalidades e costumes do frevo, e Antonio Nóbrega ensina uma pessoa da platéia a dançar frevo (fazer o passo).
Nóbrega é praticamente desconhecido na televisão do Brasil. Apesar disso, seus espetáculos são extremamente concorridos.
[editar] Discografia
Carreira Solo
• Na pancada do Ganzá (1996) - CD
• Madeira que cupim não rói (1997) - CD
• Pernambuco falando para o Mundo (1998) - CD
• O marco do meio-dia (2001) - CD
• Lunário perpétuo (2002) - CD e DVD
• Nove de frevereiro vol 1 (2005) - CD
• Nove de frevereiro - vol 2 (2006) - CD e DVD
Marco Antônio Coelho; Aluísio Falcão
ANTÔNIO NÓBREGA é um caso excepcional no Brasil. E um desaguadouro de múltiplas vertentes. Entre elas as das criações de nosso folclore, das histórias picarescas, da literatura de cordel, do circo mambembe, das folias carnavalescas e etc., tudo isso trabalhado por alguém, com formação erudita, que se dedica a resgatar as melhores tradições nas artes populares. Mas que as relança como a arte brincante, na qual a vida e a arte se confundem. Brincante porque a arte tem de educar, mas divertindo, e como um dos elementos para a transformação da sociedade. Como entende tal mister, como chegou a ele e o que pretende continuar fazendo? Eis o que relata nesta entrevista a Estudos Avançados.
Marco Antônio Coelho - Você poderia nos dar alguns dados sobre sua trajetória, principalmente a respeito da fase inicial?
Antônio Nóbrega - Vim para São Paulo em 1983, com um espetáculo chamado O maracatu misterioso. Era um solo que contava com a participação de uma segunda pessoa fazendo uma espécie de "contra-regra-que-atua". A pessoa que fazia essa contra-regragem era Rosane, minha mulher, que hoje atua comigo em Brincante e Segundas histórias.
Com a minha chegada a São Paulo dei início a um segundo estágio no desenvolvimento do meu trabalho artístico, pois a parte inicial, mais importante, penso, se dera no Recife. Eu, muito jovem, fui colocado a estudar música - violino - pelo meu pai. Minha mãe diz que eu batucava muito na mesa à hora das refeições e, por isso, parecia demonstrar inclinação para a música. De maneira que fui bater com os costados no estudo de violino através do batuque...
Durante muito tempo estudei violino e tive a sorte de ter um grande professor, um catalão chamado Luiz Soler, um homem muito austero no ensino do violino. Hoje, agradeço ao rigor e à disciplina desse professor, porque elas estão na base dos meus conhecimentos musicais. No período de seis ou sete anos, conciliei o violino com a atuação num conjunto de música popular, que eu mantinha com minhas irmãs. De vez em quando compunha músicas populares, que apresentava com esse conjunto em festivais, lá no Recife, naquela época dos famosos festivais da televisão. Em 1969 fui convidado por Ariano Suassuna para integrar o Quinteto Armorial. E aí me vi obrigado a conhecer o universo dos artistas e dos espetáculos populares, nordestinos em particular e brasileiros em geral. Até os meus dez anos de idade vivi em várias cidades do interior de Pernambuco, pois meu pai, médico sanitarista, era obrigado a mudar-se regularmente. Curiosamente eu não trago dessa fase da minha infância qualquer recordação especial sobre algum artista ou espetáculo popular que tenha assistido.
Da minha infância não me recordo de ter visto algum bumba-meu-boi, algum cantador de embolada, algum mamulengueiro. O povo, eu sempre o via no seu dia-a-dia. Ia com muita freqüência ao sertão, a família de meu pai é do sertão do Ceará, e para lá viajávamos muito (as viagens que hoje se fazem em sete horas, eram feitas em três dias). Antes de chegar em Lavras da Mangabeira (nosso destino nessas viagens) parávamos em cidades como Patos, Campina Grande, etc. e, por diversas vezes, nelas chegávamos em dias de feira e, assim, tinha a oportunidade de ver e sentir de perto o povo do sertão. Essa é uma das ligações possíveis da minha infância com o encontro posterior que tive com os artistas populares. Acho, então, que quando comecei a estudar o universo dos artistas populares reencontrei esse mesmo povo em estado de festa, de exaltação dionisíaca, de poesia.
Quando estava no Quinteto Armorial, não só me interessei pela música, mas também pelo universo total desses artistas - dançarinos, cantadores, rezadeiras, emboladores etc. Durante mais de dez anos dediquei-me a aprender tudo o que eles faziam. Com os passistas de frevo eu inventei até de tomar aulas em período não carnavalesco. Às vezes me metia a conviver com algum mestre de bumba-meu-boi e com ele aprendia a modelar figuras, a catar cipós nos mangues para fazer a burrinha, o boi etc. Outras vezes, acompanhava longamente um tocador de rabeca e procurava aprender com ele sua maneira de tocar. Enfim, fui um franco-aprendedor integral em termos de estudo com artistas populares.
Tudo isso me levou, a partir de 1976, a elaborar espetáculos em que essas referências se mostravam muito presentes. O primeiro deles foi A bandeira do Divino, e o estreei em 1976, em Recife. Depois foi a vez de A arte da cantoria, espetáculo que, inclusive, veio a participar de um festival de artes cênicas, aqui em São Paulo, promovido por Ruth Escobar. Isso em 1981, há mais de dez anos. Depois criei O maracatu misterioso, com o qual me transferi para São Paulo e dei início a uma outra fase da minha vida artística.
A dança e a música
Aluísio Falcão - Você evoluiu do trabalho de instrumentista no Quinteto Armorial para o trabalho de dança em 1976. Pergunto: dançar é artisticamente mais excitante do que tocar um instrumento?
Nóbrega, - Essa é uma pergunta que às vezes me faço. Bem, pelo lado do prazer sinto que a música leva um pouco mais de vantagem; ela me traz uma satisfação, percentualmente, um pouco maior do que tenho com a dança. Não saberia viver sem qualquer das duas, mas a necessidade da música, em mim, ainda é maior. Não sei se é pelo esforço, pois quando você vai praticar um instrumento tem um dispêndio de energia diferente daquele empregado na dança. Nela você tem de criar um auto-impulso maior do que aquele necessário para tocar ou cantar.
Embora também componha, como músico considero-me mais um intérprete. Mas o mesmo não sucede com a dança, pois nesse campo sinto-me mais como um criador. Quem está procurando uma dança brasileira, através da tradição da cultura popular, encontra um campo aberto e favorável. São muito poucas as pessoas que incursionaram por esse caminho. Isso me traz, por conseguinte, um enorme fascínio. Na dança brasileira que pressinto tudo é novo, tudo é virgem ainda e, por essa razão, sinto que estou sempre encontrando coisas ainda não tocadas.
Aluísio - Noto um aspecto, um lado seu, ao qual não se referiu - o lado ator. Queria saber como desenvolveu isso e, engatando uma outra questão, os chamados brincantes populares tanto usam o corpo como as palavras? Podemos dizer que eles são mais completos do que os atores? Estes geralmente não usam o corpo e os bailarinos, os clássicos pelo menos, não utilizam as palavras. Então, esses brincantes são artistas mais plenos?
terça-feira, 22 de junho de 2010
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